Desabafo
somente por uma noite... apenas por uma noite.
“Não quero luxo, nem lixo
meu sonho é ser imortal, meu amor!
Não quero luxo, nem lixo
quero saúde pra gozar no final...”
Rita Lee
Estou muito cansado. De tudo e de todos. De falar e não
ser visto, de olhar e não ser ouvido. Porque ajo mais através de
gestos, e todos eles me dizem quê. E reajo através dos versos, na
defesa de não me permitir a loucura. Não quero ser contaminado com
a descrença, não quero me crer como um contaminado que todos
evitam. Mas então o que fazer? Quero acreditar num amanhã, quero
crer nos homens, quero ter esperanças. Mas insistem em dizer que
não há futuro, que nada é belo, que não alimente esperanças como
se alimenta peixes com pedras. Se insisto em dizer que já não posso
calar a voz do que sinto, do que sou, do que faço; simplesmente me
ignoram. Por enquanto... Porque se insistir muito, podem me prender,
podem me machucar, pelo simples ato de ser diferente; nunca superior.
De enxergar além.
Estou muito sufocado. Por tudo e por todos. De quem
mais quero e não vê o jardim; só espinhos; do jardim que vejo e
não quer que eu habite,; só transite. Ou diz por outras palavras.
Porque o Amor é o que é, e basta. Não necessita de
racionalizações, nem de medidas e tampouco de parâmetros. Sofremos
porque queremos contextualizá-lo, queremos limitá-lo as coisas
mundanas, queremos que seja produto de consumo e descartável. Tudo é
demasiado rápido; o avião é rápido, o dia é rápido, o cometa é
rápido, o amor é rápido. Temos medo da durabilidade. Porque ela
acarreta consciência, responsabilidades com nós mesmos. E nisso
somos covardes. Recusamos a nós e castigamos o outro, porque assim nos
sentimos melhores. Dizemos coisas que machucam, mesmo dizendo que
amamos. Agora já é tarde e eu simplesmente me permito a não querer
entender isso; não querer entender os homens. Quero apenas
aceitá-los como são, sem alegria ou tristeza. Sobretudo sem dor...
mas ainda sei que não, e por isso sofro assim.
Estou muito saturado. Das coisas e dos percalços.
Ainda outra noite disse que precisava escrever para fugir da loucura.
Descobri que não posso. Não devo fugir da loucura. Porque ela é
parte de mim, e nela me insiro para ser um todo. Perguntaram se o que
me doía eram os olhos. Olho os homens e só o que vejo é o desamor,
máscaras de Viena e relógios caros. Então respondo que o que me
doí – a despeito de – são as esperas, a falta das palavras e às
vezes quem me entenda. Porque devemos ser práticos e ignorar tudo o
que resta. Devemos ter os pés no chão e não ousarmos voar. Voar é
com os pássaros, e se alguém começar a voar tudo estará perdido,
saberás ser abatido a tiros como pato. O homem perdeu a capacidade
de se comover com coisas simples, porque não o comovem levezas.
Apenas se valoriza o que é pesado, o que nos consome e por nós é
consumido: a solidão, a dor, a poluição, a loucura, o asfalto
engolindo o verde e esta coisa suja e perigosa a quem chamam de
poetas, quando querem dizer os doidos varridos, os alienados.
Estou muito doente. Por coisas e pelos percalços.
Doente da alma, doente da boca, doente do coração. Da alma que
sufoca o amor, da boca que desprende poemas insanos, do coração que
sangra sem que ninguém veja. Não que este esteja oculto, que há
muito rasguei meu peito para que o pulsar não fosse oprimido. Mas
porque é feio um peito aberto; um coração batendo e gritando
enquanto jorra causa asco. Todos estão muito preocupados olhando o
próprio umbigo, então não sobra visão para o nada mais,
principalmente as coisas ditas feias. Somos egoístas nos nossos
próprios problemas, somos sozinhos porque queremos. Refutamos ajuda,
ou não temos há quem pedir porque não percebemos o outro. Curioso
é que a gente crê que ser feliz é exatamente o mesmo que ser
triste, que amar é sempre o mesmo que machucar, que olhar no espelho
d'alma é o mesmo que fecharmos os olhos para o espelho de sorrisos
que teima em sorrir dizendo: brinco, mas falo sério!
E mesmo cansado, mesmo sufocado, mesmo saturado, mesmo
doente ainda quero crer. Porque onde só se vê obstáculos vejo
degraus; onde só se vê problemas, solução. Que sejas então um
conjunto de sereias e algas azuis, estrelas marinhas e medusas
colossais, que sejas um imenso e desmedido oceano, que sejas
vivências e querências, que sejas sonhos e realidade, mas que sejas
sobremaneira Uma dentre tantas outras. A única. Por ti aguardo
paciente; inteira; na certeza calma das casas dos relógios que
inexoravelmente veem os ponteiros avançarem como um rio que corre
para o mar. Será quando deixaremos de querer estabelecer limites e
freios para o amor e menos doídos nos perceberemos. É quando
seremos felizes...
(R. Moran)
(da série: Coisas a dizer: para alguém que está por vir...)
(da série: Coisas a dizer: para alguém que está por vir...)
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Quantos sentimentos 'intercalados' em ti.
ResponderExcluirVc sumiu...um beijo.
Ainda bem que este desabafo foi "apenas por uma única noite".
ResponderExcluirBeijo
Por mais que estejas cansado, no final, VC e pura fé: ainda crê,
ResponderExcluirQue seja essa fé, aquela que te impulsione, para vencer esses percalços,
Bjkas
Uma noite significativa e importante.
ResponderExcluirExpressar-se abre espaço para novas possibilidades!
Beijos.
Moran, a melancolia do seu texto reflete o cansaço da minha alma. Encontrei-me em cada linha, palavra ou imagem. ( veja o meu blog...)
ResponderExcluirSomos seres "ímpares" num mundo de " pares". Mas que nossos voos não nos impeçam de acreditar que ainda existe um horizonte... E que a dualidade dos sonhadores não apague a pluralidade de quem ama.
Beijo grande