Flores não tão rubras sobre a neve
(da série: Coisas a dizer...)
Flores trêmulas,
descoloridas
resistem o que podem
ao frio
sorvendo sôfregas
fios de sol
no cabedal do ocaso
da estação.
Com humilde
melancolia
vão despojando
pétalas rubras
no branco neve em
halos de sangue
escorridos dos olhos
de nuvem.
Sonolentas, se deixam
levar
ao embalo do vento
canção de ninar
dos flocos que caem
em liturgia
e entorpecem,
entontecem, endoidam.
Aos poucos adormecem
sonhando com o sol
numa cadeira
abstração de quem
pensa na morte
fim de um ciclo,
último fio do rito.
Sem ter cheiro de
chuva, cascas de fruta madura
zumbido de abelhas,
espraiados tons de areia
ilhas em tapetes de
cores, borboletas multicolores
noites claras
lunares, meninos gritando parlendas
nervuras de trepadeiras,
o vivaz limo da madeira
um besouro solto no
chão, a fugaz lagartixa no murro
a pedra que brilha de
lume, prisma etéreo de lua
da lua zombeira, dos
pés esticados da macieira
do som de realejo
grilo, corujas e uivos de cães
na ausência do sol
despertar, caladas de gelo
se deixam quedar em
inerte harmonia
ao findar de tardes
silenciosas e vazias.
Pois que então
sucumbem, inteiras
em talos raquíticos
de altiva renúncia
quanto mais se
despedaçam em cacos
mais poéticas,
inteiras e serenas.
Até que nada reste, só a semente
para que em um novo
despertar vindouro
saibam florir para
não deixar mais
de estamparem no
rosto da primavera
a esperança de quem
hoje espera e dorme em agonia.
(Perguntas então e
digo junto:
- Seremos flores?)
(R. Moran)
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