domingo, 4 de dezembro de 2011

"A BRUXA E O LUSTRE"


A Bruxa e o Lustre”

(Uma viagem incidental)


A Bruxa sobrevoou lentamente o Lustre. Veio assim, seguindo o canto do vento, passando por janelas abertas de par em par, por entre diáfanas cortinas, voando em espiral até tocar de leve suas faces aquecidas.

O primeiro contato trouxe o calor que a filha da natureza reconheceu como sendo uma das necessidades básicas do ser vivente: abrigo, alimento, água e primevo fogo.

Ao se distanciar um pouco, a Bruxa observou os detalhes do Lustre. Ele era assim

Pendia de um fino fio de aço cristal do teto carmim aveludado. Onde o contato do fio se dava com a base invertida do Lustre, haviam miríades de diamantes o circundando. Descendo ao redor do fio suspensor, braços translúcidos carregados de cristais como pencas de uvas sirah. Com transparência e lapidação precisa, os cristais permitiam uma profusa reflexão dos feixes de luz, proporcionando luminosidade, brilho e acima de tudo encantamento. Os feixes de luz espalhados pelos braços dos lustre clareavam os pendentes que o suspendiam, irradiando luz em suaves ondas que se espalhavam por toda a sala.

A Bruxa deu meia-volta no ar e notou que da base pendia um outro fio de aço cristal, que ia dar numa pirâmide invertida de faces translúcidas de alabastro, onde em seu interior ardia um coração incandescente.

Se encontrava numa sala que bem podia ser do sec. XVI ou XXI. Mas naquele momento, o que importava era que a bruxa tinha calor... e ele era bom.

A Bruxa tocou de novo a face invertida da pirâmide tentando ficar um pouco mais, porém o calor doeu e ela ergueu voo de novo sobre a sala.. Distanciando um pouco mais, a Bruxa percebeu que por mais que machucasse, a luz exercia um fascínio do qual não podia se livrar.

Então aproximou-se uma vez mais e extasiada, percebeu que o amor estava além de limites. – O que era aquele calor a deter uma chama que nem o vento e o tempo hão de apagar?

E naquele ultimo lampejo do que é denominado princípio inteligente, a Bruxa sobrevoou pela última vez a sala e se precipitou no interior da pirâmide, onde o coração incandescente a esperava.

De manhã, ao abrir a porta da sala, o alquimista se deparou com o corpo estorricado da bruxa no chão. E ao olhar o lustre, ele descobriu que nem onde a força e a sabedoria mundana hão de penetrar, a verdadeira essência do ser vivente e sua consequente “pedra filosofal” estava em ser feliz, ainda que fosse por um fugaz momento: ouro, vida, amor ou primeva luz.

E pensando nisso ele chorou, e largando seus livros – agora inúteis – saiu a contar pelo mundo o triste e belo amor de uma Bruxa por um Lustre.



(R. Moran)
(Obrigado Renato Russo, pela música de fundo.

Obrigado aos amigos incidentais deste ensaio.)

(da série: Coisas a dizer...)



01/01/1990 - “Na era de Aquário”



Apesar de sofrer intervenções atuais, penso que a data de conclusão merecia continuar perdida no tempo, naquela madrugada de réveillon onde subitamente me vi chorando sem saber, e pegando a caneta, escrevi em poucos minutos a estória da Bruxa que entrou pela janela quando estava “fora de mim”, e morrendo na minha frente, me ensinou uma lição. Que quando após no novo século, me vi subitamente chorando novamente, soube que alguém ainda estava por vir...

                                                      * todos os direitos reservados ©

Um comentário:

  1. Lindo texto, me emocionou, me fez refletir sobre muitas coisas... uma boa semana pra vc tambem! Bjos!

    ResponderExcluir

Obrigado por sua participação. Seja livre para opinar, discordar, dar sugestões ou contribuir para o melhor caminho do Andarilho.

Para mí, solo recorrer los caminõs que tienén corazón...